O magnetismo contido nesta história está atrelado ao seu desenvolvimento surpreendente e imprevisível, que não permite ao leitor sequer imaginar qual será o seu desenrolar. Dos poucos livros que li de Saramago, este foi o que mais me aguçou a curiosidade em conhecer o seu desfecho, apesar de já estar familiarizada com o recurso estilístico da sua escrita. Nessa obra, o autor ter buscado preservar aqui a marca que lhe é característica em todas (ou em quase todas) as suas obras: a narrativa irônica e sem pontuação, com exceção de alguns pontos finais que apenas encerram algum fluxo de diálogo ou de pensamento.
O livro nos traz a história de Tertuliano Máximo Afonso, um professor de história de 38 anos que vive em profunda solidão após passar por um divórcio. No início da obra, o que se pode constatar é que Tertuliano demonstra sinais do que poderíamos chamar de um início de depressão, mas que é por ele definida como “marasmo”: uma vida sem grandes emoções, sem grandes acontecimentos, marcada apenas por hábitos cotidianos e escolhas automáticas. Ou seja, uma vida linear, mas triste e silenciosa em quase todos os seus aspectos.
As coisas parecem mudar de rumo quando, após receber uma indicação de um colega de trabalho, Tertuliano vai até a locadora para locar uma fita cassete e é surpreendido ao assistir ao filme e constatar que um dos figurantes, que quase lhe passou despercebido, é interpretado por um ator que é completamente igual a ele.
Com o espanto causado em Tertuliano ao se deparar com um seu eu duplicado na produção, tem início uma verdadeira saga do personagem para descobrir a identidade do autor que com ele se assemelha fisicamente.
Aqui, é importante esclarecer que a obra não se propõe a desenvolver uma ficção científica. O leitor não se deparará com a história de dois irmãos gêmeos ou mesmo de clones. Na realidade, a história é muito mais profunda e complexa do que aparenta de início, por isso é bom adiantar que ela não se atrela aos porquês desses dois homens serem idênticos.
A busca incessante de Tertuliano encerra a parte inicial da história, que esteve centrada apenas no cotidiano do personagem. A partir disso, acompanhamos as experiências e as consequências irreparáveis dessa descoberta na vida dos personagens centrais, extraindo dessa narrativa uma reflexão sobre a perda da identidade, o individualismo e a necessidade de pertencimento.
O livro nos convida também a refletir sobre as nossas máscaras e a verdadeira natureza dos nossos sentimentos – na maior parte das vezes “escondidos” entre os papéis que decidimos ou somos levados a exercer na sociedade contemporânea.
“O Homem Duplicado” é uma história repleta de simbolismos que merece ser lida com cuidado e atenção em cada detalhe. Não se intimide pela sua aparente complexidade: ela vale totalmente a expectativa! Recomendo e não é pouco.
O livro foi adaptado para o cinema em 2013 e o ator Jake Gyllenhaal foi o escolhido para interpretar Tertuliano na tela, onde, na realidade, recebeu o nome de Adam Bell.
Boa leitura e forte abraço!
Ficha técnica:
Livro: O Homem
Duplicado
Autor: José Saramago
Ano de
lançamento: 2002
Editora:
Companhia das Letras
Nº de
páginas: 318
Gênero: Ficção

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